Obesidade infantil: A culpa é da publicidade?

33% das crianças brasileiras têm excesso de peso, 15% já são obesas e até 2030 quase metade da população adulta estará acima do peso.


Ao ligar a TV, folhear revistas, navegar na internet, e principalmente ao entrar em supermercados ou lojas de conveniência, é fácil perceber o apelo visual e/ou sonoro do mercado publicitário destinado ao público infantil. 

Muitas cores, brindes, personagens, objetos colecionáveis e trilhas sonoras tentam ‘seduzir’ as crianças e influenciar o consumo de produtos ou serviços, desconsiderando a importância de uma alimentação saudável e balanceada. 

Segundo dados de uma pesquisa recente, 33% das crianças brasileiras têm excesso de peso, 15% já são obesas e até 2030 quase metade da população adulta estará acima do peso. A aprovação (ocorrida em maio de 2014) da Resolução 163 do Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), órgão ligado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República — que considera abusiva a prática do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao adolescente, com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço, abrangendo anúncios com linguagem, trilhas sonoras e distribuição de brindes em anúncios nas mídias como TV, sites, rádio, revista e jornal, assim como propagandas em embalagens e merchandising — visa reverter esse cenário, e traz à tona a questão da responsabilidade e das conseqüências negativas que esses estímulos podem trazer a longo prazo.

Para discutir mais o assunto, o GEN publica na íntegra o artigo de Flávia da Silva Santos, professora do curso de Nutrição do Centro Universitário Anhanguera de Niterói (UNIAN).


MARKETING DESTINADO AO PÚBLICO INFANTIL

Por Flávia da Silva Santos *


Segundo a Pesquisa de Orçamento Familiar, realizada entre 2008-2009 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, uma em cada três crianças brasileiras com idade entre 5 e 9 anos estão com peso acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde e pelo Ministério da Saúde.

Estudos estimam que 95% dos casos de excesso de peso em crianças estariam relacionados à má alimentação, os outros 5 % seriam resultado de fatores orgânicos. 
Em função de sua crescente influência e autonomia na escolha dos produtos adquiridos pela família, as crianças estão assumindo um papel cada vez mais importante nas decisões de consumo, o que as tornam um segmento de mercado cada vez mais visado nas estratégias de marketing das empresas de produtos manufaturados.

Pesquisas mostram ainda que crianças brasileiras influenciam cerca de 80% das decisões de compra de uma família. As categorias de produtos mais suscetíveis à influência infantil são os produtos alimentícios industrializados. Desses produtos, estão no topo da influência a compra de biscoitos e bolachas (87%), refrigerantes (75%), salgadinhos (70%), seguidos de achocolatados, balas, chocolates, iogurtes, macarrão instantâneo, cereais e sorvetes.

Tal fato é relevante, pois, os índices de crianças com sobrepeso acompanha o crescimento do volume investido no marketing infanto-juvenil pela indústria alimentícia.

Investigando a influência do marketing nas escolhas alimentares das crianças, as alunas do Centro Universitário Anhanguera de Niterói (UNIAN), Aline Andrade de Oliveira e Graziela de Almeida Pereira Lobo, sob a minha orientação, analisaram os rótulos de 22 produtos que apresentavam apelos atrativos ao público infantil (personagens, desenhos, brindes, etc). Dentre os alimentos foram revisados os rótulos de bolos industrializados, fast food, laticínios, cereais matinais, sucos prontos, empanados, bebidas achocolatadas, macarrão instantâneo, biscoitos recheados e salgadinhos.

O sódio esteve presente em quantidades excessivas (mais que 1,2 mg%), nas porções de bolos industrializados, sucos industrializados, bebidas achocolatadas, cereais matinais, empanados, salgadinhos, macarrão instantâneo e fast foods. Com relação ao biscoito recheado, se nos basearmos na rotulagem nutricional obrigatória recomendada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para crianças de 7 a 10 anos, a ingestão de todo o pacote fornece 96% da quantidade recomendada diária para sódio.

Notou-se alta densidade energética nas porções de bolos, biscoitos industrializados, cereais matinais, frangos empanados, salgadinhos, macarrões instantâneos, fast foods, que normalmente são consumidos em quantidades superiores as porções apresentadas nas tabelas de informações nutricionais desses alimentos. A densidade energética é definida como a caloria disponível por unidade de peso.

Os alimentos industrializados induzem ao consumo excessivo de calorias, pois apresentam alta densidade energética, alta palatabilidade, além do baixo custo, fácil acesso e alto marketing. A alta ingestão de energia desencadeia o desenvolvimento da obesidade e, consequente, eleva o risco de diversas outras doenças, como as cardiovasculares, diabetes e alguns tipos de câncer.

A análise dos ingredientes mostrou a presença de conservantes e edulcorantes (adoçantes) em sucos industrializados e gelatinas, que não é indicado para crianças que não apresentam diabetes.

Dentre os 22 alimentos analisados, 86,4% apresentaram alto teor de sódio, 45,4% apresentaram gordura saturada acima de 10% e, 63,6% se mostraram com alta densidade energética.

A rotulagem nutricional dos alimentos permite ao consumidor o acesso às informações nutricionais e aos parâmetros indicativos de qualidade e segurança do seu consumo.

Apesar da legislação brasileira de rotulagem de alimentos ser abrangente há ainda a necessidade de maior fiscalização para cumprimento das normas estabelecidas. Outro ponto a ser discutido é a adequação da informação nutricional presente nos rótulos à idade do público-alvo ao qual o alimento se destina.



Flávia da Silva Santos é professora do curso de Nutrição do Centro Universitário Anhanguera de Niterói (UNIAN)







Leitura do Mês:

Emagrecimento Permanente - Nutrição para uma Vida Saudável



O livro apresenta orientações nutricionais e comportamentais para a perda e a manutenção do peso, com base nas mais recentes recomendações de órgãos nacionais e internacionais.

Prática e objetiva, esta obra aborda ainda um método de controle da ingestão alimentar e um programa de reeducação nutricional com base no teor de fibras da dieta. Todo o conteúdo deste livro foi fundamentado no conceito de calorias inteligentes – provenientes dos alimentos ricos em fibras, vitaminas, minerais e compostos bioativos, e pobres em calorias biodisponíveis –, visando à total qualidade de vida, saúde e longevidade.

Onde encontrar: http://bit.ly/1wPPBn8


Sobre a autora


Manuela Dolinsky é doutora em Ciências pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP), mestre em Nutrição Humana pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professora adjunta e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Nutrição Funcional (GPeNF) da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal Fluminense (UFF).